REPORTAGEM

Fusões e aquisições no mercado educacional:
saídas para a crise

Crises existem e sempre vão existir. Mas, junto a elas, existem também grandes oportunidades de mudança. No mercado educacional, muitas escolas de ensino básico não estão conseguindo se manter financeiramente saudáveis com a pandemia e buscam diferentes alternativas para minimizar suas dificuldades. Dos caminhos que, a princípio, podem parecer assustadores, mas que vem apresentado bons resultados, estão o das fusões e o das aquisições.

Fusões e aquisições já vinham sendo feitas em maior escala no Brasil nas instituições de Ensino Superior. Em busca de maior competitividade, por meio de ganhos de escala e um upgrade de recursos tecnológicos, muitas universidades viram nesse modelo de negócio um modo de sobrevivência. A mesma saída começa a ser buscada pelas escolas de Ensino Básico, embora em um número ainda considerado pequeno no contexto geral.

“É preciso desmistificar um tema que, para o mercado de educação, parece ser algo sombrio, complexo e difícil de lidar, quando, na verdade, é o contrário: o tema aquisições”, diz o administrador Guilherme Lima, sócio e coordenador de expansão da Rede Decisão desde 2017.  

A Rede Decisão nasceu em 1984, com uma escola com 500 alunos, em São Paulo. Em 2015, começou seu processo de expansão, com a compra de outras escolas e hoje, o grupo tem 10 unidades em São Paulo e uma escola em Minas Gerais. Ao todo, são cerca de 6.500 alunos pagando um ticket médio de $700 reais por mês.

Pós-graduado em Finanças e sócio da Rede, Lima explica a necessidade dos gestores estarem com o radar atento para que a escolha de vender a instituição não aconteça tarde demais: “Existe um ponto em que o negócio fica insolúvel, em que não há mais nada o que fazer. Por isso, é muito importante planejamento; não pode esperar o barco afundar para tomar uma decisão. Nesse tipo de crise atual é muito difícil planejar, mas no momento em que ocorre algo assim, é hora de procurar pessoas para conversar, trocar ideias, buscar ajuda mesmo, desde bater um papo a uma decisão maior. O ambiente no momento precisa ser colaborativo.”

Para ser o mais colaborativo possível, o grupo criou um material divulgado abertamente para ajudar a comunidade escolar a enfrentar o momento com base em sua própria experiência.  “Nós não víamos como sobreviver sendo uma escola pequena de bairro, em um mundo cada vez mais competitivo, então pensamos: ou devemos crescer e adquirir novas escolas ou vender. Claro que existem casos diferentes em que ainda há uma terceira opção, que é ser uma escola de nicho, muito especializada no que faz e garantindo assim sua sobrevivência.”

Quem diz isso é Gabriel Alves, cofundador e CEO da Rede Decisão, formado em Comunicação e pós-graduação em Finanças. Depois de seis anos atuando no mercado financeiro, Gabriel atua desde 2015 liderando a gestão administrativa e pedagógica da rede, criada pela mãe dele.

Gabriel chama atenção para a complexidade do ambiente educacional e diz que isso vai exigir muito dos gestores escolares, que podem materializar oportunidades neste momento em que existe uma janela de oportunidades. Uma delas é o mercado de aquisições.

“A gente é muito otimista em relação ao futuro. É um momento triste no que diz respeito à saúde pública, mas que me anima pela oportunidade de transformações sociais que a gente pode realizar e com oportunidades gigantescas na educação. Eu acredito que as escolas que souberem aproveitar este momento, levar suas equipes à nova era digital, estreitar laços com famílias, inovar com responsabilidade, provavelmente vão sair muito mais fortes desta crise”, diz Gabriel. 

A estratégia da Rede Decisão, ao longo dos anos, tem sido focar em investir em pontos com o menor custo financeiro e maior impacto para a aprendizagem. Hoje, o grupo conta com uma central única, para cuidar de toda a parte burocrática, “para que cada escola possa focar na aprendizagem e no atendimento aos pais.”

“A gente não quer ter uma escola de ensino, a gente quer ter uma escola de aprendizagem eficiente, com uma educação de qualidade a um preço acessível.”

Diferentes visões sobre o tema fusões e aquisições

A visão do “comprador”: o Case do grupo inglês Cognita School 

O grupo inglês Cognita School comprou a escola paulistana PlayPen Bilingual Education, o Instituto GayLussac, em Niterói (RJ) e no ano passado o Colégio Maxi de Londrina (parcialmente adquirido). No mundo todo, o grupo já tem cerca de 70 escolas, sendo 16 na América Latina, com um total de quase 40 mil alunos matriculados. Josep Caubet, CEO da Cognita School na América Latina, explica que no ensino básico o ritmo é diferente em relação ao mercado da educação superior. Um dos objetivos do grupo inglês é preservar o DNA das escolas associadas, agregando valor com a internacionalização do colégio e a troca de processos pedagógicos.

“Se levamos cerca de 16 anos para formar um aluno, apenas no fim deste ciclo saberemos se nosso trabalho foi feito com louvor. Antes disso, temos apenas teorias”, diz. Segundo Coubet, o grupo tem grande preocupação com a cultura da escola comprada, mais do que no balanço, número de matrículas, valor de mensalidades e custo operacional. Para o CEO, a consolidação da qualidade do ensino básico no Brasil ainda tem um longo caminho e depende muito da qualificação de alunos e professores, com foco em metodologias personalizadas e um forte elo entre pais, alunos e professores.

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A visão do "vendedor": o case da Escola da Vila

No fim de 2016, os gestores da instituição construtivista Escola da Vila foram procurados pelo grupo Bahema, que hoje é controlador de 80% do capital da instituição. Pensando na perenidade da escola, no processo sucessório, e na necessidade de investimentos constantes, a escola decidiu fechar negócio com o grupo. A diretora geral da escola Sonia Barreira, já pensava na época em alternativas de crescimento: “Nosso temor era que nossa instituição não conseguiria fazer frente a essas necessidades num cenário de alta competição no mercado educacional”. Após conversas com alguns investidores, as sócias da escola decidiram negociar com o grupo Bahema, com a determinação de aproveitar a oportunidade para resolver problemas da instituição e ainda fortalecer seu modelo pedagógico, pois o grupo Bahema havia decidido investir em outras escolas com o mesmo DNA construtivista.

A preocupação de escolas menores com fusões e aquisições

Mônica Capuzzo, diretora e mantenedora da escola Projeto Vida, teme que as fusões e aquisições no mercado educacional atrapalhem ainda mais a sobrevivência de pequenas escolas com propostas educacionais consistentes.

Um dos pontos levantados por Mônica é que com disponibilidade de grande capital, esses fundos de investimento podem causar uma grande oscilação no mercado, já que oferecem propostas bem comerciais.

A educadora questiona se com a multiplicação dessas aquisições ainda haverá espaço para pequenas e médias independentes: “Os fundos de investimentos têm a possibilidade de trabalhar por alguns anos no vermelho para dominar o mercado, enquanto outras fecham as suas portas”.

‍Embora considere o crescimento desses movimentos de mercado na educação privada como algo inevitável, Mônica aponta que o método ainda apresenta contradições. A mais preocupante, na opinião da mantenedora é a de que a formação de grandes grupos de educacionais acabe por padronizar todo o sistema de ensino.

“Me interessa saber qual é a real situação deste mercado, quais serão as consequências dessas ações num futuro próximo e como podemos garantir que a proposta pedagógica de cada colégio será mantida", afirma.

Motivações para a compra de uma escola

A escola compradora pode ver em sua instituição uma boa oportunidade para conseguir entrar em uma nova região;
Pode ver na instituição à venda um modelo de ensino coerente com o seu e por isso uma chance de expansão;
Pode ver na escola uma oportunidade de crescimento a partir da incorporação de algo de grande qualidade.

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Motivações para a venda de uma escola

Sucessão (falta de familiares para seguir o caminho da empresa)
Questão financeira (realização financeira ou mesmo uma crise como a atual)
Ganho de sinergia (casamento entre interesses do comprador e do vendedor)
Profissionalização do mercado

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“O mercado de escolas está passando por um momento de consolidação, em que ocorre a profissionalização dos processos, como investimento em tecnologia. Chega um momento em que alguns mantenedores não se veem capazes de fazer isso sozinhos e sem poder financeiro para fazer as mudanças necessárias,” diz Guilherme Lima, sócio e coordenador de expansão da Rede Decisão desde 2017.

Quando faz sentido a aquisição de um negócio:

• A escola tem a partir de 500 alunos para fazer sentido para o grupo consolidador.
• A escola não está no raio de atuação do grupo (20 minutos de carro), para não haver “rouba-rouba de alunos” da mesma região.
• Oportunidade de sinergia (questão colaborativa pedagógica) e entrada em uma nova região.

Segundo Guilherme, existem dois modelos de aquisição: aquisição do negócio e aquisição ou transferência de alunos. A modalidade de transferência de alunos vem surgindo no mercado e a própria rede Decisão já utilizou a estratégia: “Nesse caso a escola transfere seus alunos para outra e recebe por esses alunos transferidos. Isso faz sentido em escolas que têm até 150 alunos, no mesmo raio de atuação (ou seja, menos de dez minutos de carro) e com capacidade ociosa da unidade que vai absorver esses alunos.”

Quais são os critérios de avaliação de uma escola?

A Rede Decisão divide esses critérios em 3 grandes grupos: informações pedagógicas; informações financeiras e critérios quantitativos e, por fim, critérios qualitativos.

“Só na parte pedagógica existem cerca de 50 perguntas para entender bem como o colégio funciona e se faria sentido a aquisição. Nos critérios financeiros, entram questões como número de alunos, mensalidade média, custos e despesas, modelo de tributação, ... E os critérios qualitativos envolvem, entre outros pontos, análise de concorrentes, de espaço para crescimento no bairro, diferencial, possibilidade de valor agregado, ...”

O que valoriza e desvaloriza um negócio?

“O que valoriza uma escola é, entre outros pontos, ter uma boa gestão financeira, um bom modelo de tributação, de preferência “Lucro Real” para os colégios maiores, uma gestão independente e uma equipe organizada, um alto índice de satisfação do cliente (NPS), recolhimento correto de impostos.”

“O que desvaloriza? Passivos tributários, fiscais e trabalhistas; estrutura física desvalorizada, sem manutenção e melhorias contínuas, informalidade trabalhista, uso de diversos CNPJs para “economizar” impostos, uma gestão financeira “no papel”, sem clareza para acesso de informações, etc.”

Etapas básicas de um processo de compra/venda de uma escola

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Assinatura de um “Acordo de Confidencialidade” para proteger informações

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Recebimento de informações para avaliação da escola

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Carta de intenções com termos do negócio

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Contrato de aquisição final com todas as condições da transação e necessidade de assessoria jurídica

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Período de diligência/auditoria e integração focada principalmente em conectar as pessoas de todas as áreas, padronização pedagógica, administrativa e comercial

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Conclusão da transação

“A passagem de bastão é como uma corrida de revezamento. O bastão tem que ser passado da melhor forma, e o mais importante é não abandonar seus alunos. Fora isso, a escolha de quem vai comprar sua escola tem que ser também de coração, não só financeira. Tem que haver empatia, conhecer o outro lado e saber se os compradores vão dar continuidade a seus sonhos e perpetuar o que foi construído”, completa Guilherme.

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